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Naquele tempo

A vida era longa e serena, e não ia acabar nunca. Não tinha cerveja, os bêbados bebiam pinga, bares eram poucos e fechavam cedo. Nas madrugadas a gente via assombrações, um galho de roseira raspando o muro seco assustava quem andava distraído na rua de paralelepípedos rugosos, as corujas voavam baixo e os morcegos zuniam na sua surdez de adivinhos.
Os relógios nunca atrasavam nem adiantavam, os trens eram absolutamente regulares nos horários de subida e descida, ninguém faltava ao serviço e nem deixava de carimbar o cartão, almoço tinha hora, a janta era antes da ave-maria e os galos cumpriam religiosamente o dever de cocoricar nas madrugadas insones, o mundo tinha uma ordem imutável - chovia, fazia frio, fazia calor e se chovesse a gente usava guardachuva, se fizesse sol, chapéu. As famílias se visitavam, bebiam licor de jabuticaba, as crianças brincavam na rua, cinema só tinha de sábado e domingo, os domingos não acabavam nunca, “Hoje é domingo, pé de cachimbo, cachimbo é de barro, bate no touro, o touro é fraco, bate no jarro, o jarro é de ouro, caiu no poço, o poço é fundo, acabou-se o mundo“. É como esse pé de cachimbo, que a gente só descobriu, muito tempo depois que o domingo pede cachimbo.

Juvenil de Souza, velho ranzinza, se irrita com crianças brincando e cantando velhas cantigas.

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